terça-feira, fevereiro 22

DESAGRAVO AO POVO PARAENSE

Na condição de o mais paraense dentre os amazonenses radicados em Belém, capital do Pará, quero desagravar os irmãos deste Estado que foram atingidos pelo destempero verbal do prefeito de Manaus, no lamentável episódio em que o Sr. Amazonino Mendes atribuiu a relutância de certa cidadã em abandonar a casa dela, situada em lugar com risco de desmoronamento, ao fato dela ser paraense. Isto depois dele ter dito que, em face da atitude da mulher, ela deveria morrer.
A cena grotesca chocou a todos quantos assistiram à matéria, nos telejornais. O jurássico homem público amazonense demonstrou, em primeiro lugar, despreparo para lidar com pessoas, em situações tensas. Por mais insensata possa ser a atitude da cidadã, nada explica, muito menos justifica a reação do prefeito de Manaus, que já foi governador daquele Estado e senador da República. Do verdadeiro homem público o mínimo que se espera é temperança, mesmo nas situações limites.
Ao obter da senhora, em resposta à pergunta dele, a afirmação dela ser paraense e, diante disso, fazer o comentário “então está explicado”, demonstrou o Sr. Amazonino, ignorância quanto à história recente do Estado do Amazonas e da Amazônia.
Qualquer pessoa medianamente informada sabe que o êxodo de nativos dos mais diversos estados amazônicos no rumo de Manaus, se deu a partir dos anos 60 do último século do milênio passado, em decorrência da política do governo militar para ocupar e desenvolver a Amazônia, por meio da implantação da Zona Franca de Manaus, em 1967, como estímulo à industrialização da cidade e suas adjacências.
Até pela facilidade de deslocamento e pelo fluxo tradicional de ribeirinhos da calha do rio Amazonas entre as cidades dessa calha, inclusive Manaus, na confluência com o Rio Negro, foi natural que essa migração para Manaus, se desse por paraenses. Especialmente os nativos da antiga zona do contestado que havia entre os Estados do Pará e do Amazonas, até a primeira metade do século passado. Aquela região em torno do rio Nhamundá, que faz o limite entre os estados do Pará e Amazonas, onde ficam o lago do Aduacá e outros, que afinal foram reconhecidos como amazonenses. Claro que o crescimento de Manaus, em razão da Zona Franca, atraiu outros ribeirinhos paraenses mais “de baixo”, na linguagem nativa, como Santarém, Monte Alegre, Alenquer, Óbidos, etc.
A “rodagem” do Sr. Amazonino não lhe confere direito à ignorância desses fatos. Sobra então, a má fé ao pretenso desconhecimento.
A presença massiva de nativos deste ou daquele Estado, nesta ou naquela Unidade da Federação, há que ser entendida dentro do contexto histórico e não pode ser justificativa para atitudes preconceituosas e discriminadoras como a do prefeito de Manaus. As mesmas razões explicam o êxodo nordestino no rumo de São Paulo, no século passado e, de certa forma, a grande migração de maranhenses para este estado do Pará, nos últimos anos. E qualquer colocação preconceituosa, discriminadora, contra qualquer um desses cidadãos brasileiros é odienta, absurda e criminosa.
Sim, criminosa. Assim dispõe o artigo primeiro da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, com a redação dada pela Lei nº 9.459, de 15 de maio de 1997: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
Peço desculpas aos irmãos paraenses, pela atitude ridícula e detestável do prefeito de Manaus e coloco-me ao lado dos que clamam por providências do Ministério Público, da OAB, de entidades de defesa dos direitos humanos, que enfatizando os efeitos da prática do crime de preconceito para o cidadão comum- a denúncia, o processo e a prisão, perguntam: o que vai acontecer com o Sr. Amazonino Mendes?
Octavio Pessoa
Jornalista e advogado
E-mail: octavio.pessoa.ferreira@gmail.com

Um comentário:

  1. Octavio, excelente desagravo.

    É bom lembrar aos irmãos do Amazonas: quase toda matéria prima que vai para Manaus, para a ZF, passa pelas estradas de Belém.

    Vai as matérias primas, ficam os buracos provocados pelas imensas carretas.

    Morei em Manaus, em 1987, e, sei: essa animalidade é latente entre Amazonenses e Paraenses.

    Muito mais pelos Amazonense (e sabe lá por que acham que são superiores...) do que pelos Paraenses.

    Sem motivo.

    Isso tem que acabar!

    Grande abraço!

    Benny Franklin

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