Catalina amerissando. Imagem do Blog do Rocha, de Manaus-AM. |
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Passageiros
em trânsito!!!!
(pausa)
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Passageiros
locais!!!!
Era assim
que, com sua potente voz, o Sr. Moisés
Cohen, agente da Panair do Brasil em Parintins, Amazonas, minha terra natal,
anunciava aos passageiros que, em breve, o Catalina da Panair do Brasil iria
levantar vôo, das barrentas águas do Rio Amazonas, no rumo de Manaus ou de
Belém, e escalas, dependendo do avião estar “de subida” (se estivesse indo para
Manaus), ou “de baixada” (no rumo de Belém).
Aí, os
passageiros pegavam a catraia, grande canoa movida a remo, conduzida pelo
Osvaldo, o catraieiro responsável pelo trajeto porto-avião-porto, e seguiam na
direção do hidroavião, que ficava atracado a uma boia, em frente à rampa lateral ao
mercado municipal da cidade. Após a entrada de todos os passageiros no avião, a
catraia se afastava e então, as hélices começavam a girar. Daí a pouco, o
Catalina levantava vôo e seguia sua rota. Eu contemplava o banzeiro que se
formava naquelas águas e acompanhava com o ollhar, a subida da aeronave, até se
perder no horizonte. Imagens
como essa, nunca se apagam na memória da gente. A chegada e a saída do Catalina
da Panair movimentavam a cidade.
Felicidade
total, foi quando lá pelo início dos aos 60, eu entrava num Catalina, junto com
meu saudoso pai Octacílio José Pessoa Ferreira, para fazer minha primeira viagem a Belém do Pará. Realização de dois sonhos, voar num Catalina e conhecer a Metrópole da Amazônia.
(cai o
pano)
Uns 50
anos depois, em 2012, na visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de
Nazaré, ao Hospital da Aeronáutica, em Belém, então comandado pelo amigo Coronel
Médico Camerini, conheci o segundo sargento reformado, Walter Florentino de
Souza, um Catalineiro. A conversa girou inevitavelmente sobre Catalinas e
Catalineiros. Um gostoso papo saudosista em que conheci detalhes interessantes
daquele hidroavião. Ao saber de minha vivência em relação aos Catalinas, Florentino
ratificou um convite que, antes, já me fora feito pelo meu irmão de
ordem, Enock Rabelo, da reserva da Aeronáutica que nem Florentino, o convite para ingressar na
ABRA-CAT, Associação Brasileira dos
Catalineiros e colaborar para o fortalecimento dessa entidade que reúne os
remanescentes trabalhadores nos catalinas e todos os que, de
alguma forma, tiveram contato com os Catalinas, inclusive como passageiros.
O Catalina
era um hidroavião bimotor, de uso militar durante a Segunda Guerra Mundial,
construído pela empresa Consolidated Aircraft, para transporte e vigilância
aérea. A Força Aérea Brasileira-FAB utilizava os Catalinas, em missões de
patrulha no litoral brasileiro.
Conhecido como Patachoca, em razão de sua aparência enquanto flutuava sobre as águas, o Catalina voava a 250 Km por hora e tinha autonomia
para 4 mil quilômetros. Era movido por dois motores Pratt&Whitney, de
1.200 HP, cada um deles. Media quase 20 metros de comprimento, por 32 metros
de envergadura de asas, aí incluídos os 2 flutuadores, as “canoinhas”,
encaixadas nas extremidades das asas, que se dobravam verticalmente, no momento
da amerissagem e facilitavam a flutuação e o equilíbrio da aeronave.
Com o fim
da guerra, o catalina já sem a couraça de guerra, dos canhões, das metralhadoras e bombas, assumiu uma nova função, a de busca e salvamento. Em
1958, foi reconfigurado para servir como cargueiro, prestando inestimáveis
serviços à Amazônia, carente de infraestrutura aeroportuária. Só um avião
anfíbio, que pousa em terra e na água, poderia operar na
Amazônia com seu mundo de águas e atender as cidades que, logicamente, surgiram
ao longo das calhas dos nossos rios, as ruas da Amazônia nas palavras de Rui Paranatinga Barata.
A partir de
1950, os Catalinas passaram a ser explorados comercialmente. A empresa Panair do Brasil,
utilizando os famosos PBY5 de 16 lugares e cadeira de vime, transportava
passageiros entre as cidades amazônicas, numa rota que seguia basicamente a calha
do rio Amazonas.
Os
Catalinas amerissavam junto às cidades de Curralinho, Gurupá, Altamira, Monte
Alegre, Santarém e Óbidos, no estado do Pará. Prosseguiam estado do Amazonas a
dentro, servindo às cidades de Parintins, Itacoatiara, Manaus, Coari, Codajás,
Tefé, Fonte Boa, Içá, São Paulo de Olivença, Tabatinga e Benjamim Constant, e
adentrava o território peruano, alcançando as cidades de Pebas e Iquitos.
Durante décadas, a Panair e seus catalinas desempenharam importantíssimo papel,
na integração das cidades ribeirinhas da Amazônia, como descreve com extrema competência e felicidade raramente vista nos romances históricos, Ademar Ayres do Amaral, em sua obra “Catalinas e Casarões”,
Edição do Autor, 2009. Ademar narra inclusive, os vínculos que se estabeleceram entre tripulantes da
Panair do Brasil e pessoas da família dele.
Em 1966, o
regime militar implantado no Brasil, dois anos antes, decretou a quebra da
Panair do Brasil, num processo, até hoje, carente de explicações. As linhas
aéreas internacionais daquela empresa, passaram a ser operadas pela Varig e as
domésticas, inclusive a da Amazônia, pela então Cruzeiro do Sul, que mais
adiante, foi absorvida pela Varig. A Cruzeiro ainda operou com os Catalinas,
até 1968, quando os Patachocas foram “encostados”, passando então, a empresa, a operar com
os Douglas DC3, com uma particularidade. No extenso trajeto entre Belém
e Manaus, apenas uma escala, em Santarém, ante a carência de
aeroportos. O governo federal comprometeu-se a construir campos de pouso, tarefa que ficou a cargo da COMARA- Comissão de Aeroportos da Região Amazônica, que passou a construir aeródromos nos diversos municípios da Amazônia, não necessariamente nas cidades ribeirinhas.
DC-3 da extinta Panair. A partir de 1968, a Cruzeiro passou a operar na Amazônia, com esses aviões. |
A brusca
suspensão das concessões da Panair do Brasil teve efeito catastrófico para as
cidades ribeirinhas da Amazônia, em sua grande maioria aglomerações humanas
de pequeno porte, mas que mesmo assim,
eram servidas pelos Catalinas. A partir de então, passageiros das cidades do
Médio e Baixo Amazonas, por exemplo, passaram a se deslocar de barco, às vezes em condições
precárias, até Santarém, para, de lá,
pegarem um avião, para Manaus ou para Belém.
Isso quem tinha boas condições financeiras. Os menos abonados passaram a
utilizar unicamente o transporte fluvial que,
com o sucateamento da frota branca da ENASA, Empresa de Navegação da
Amazônia e Administração do Porto do Pará, ficaram entregues a um incipiente e precário transporte fluvial.
Mas, isso é pauta para outra matéria.
Com a extinção por decreto da Panair do Brasil,
os Catalinas retornaram às Bases Aéreas da Força Aérea Brasileira.
Na manhã do dia 19 de julho de 1984, o 6525, o último
C-10 Catalina, que realizara seu último vôo oficial, em 12 de junho de 1982, na
Base Aérea dos Afonsos/RJ, deu adeus aos céus da Amazônia, mais precisamente de
Belém do Pará.
Aquele
avião, que tem História, foi totalmente reformado na Base Aérea de
Belém, por uma equipe de especialistas da FAB, de que o mecânico de estrutura
de aviões, Florentino, fez parte. Essa equipe foi muito elogiada pelos veteranos
pilotos americanos Roy E. Degan e Lee Andrews, os condutores do último
Catalina, para os Estados Unidos, que se disseram impressionados com o estado
de conservação e a capacidade operacional do velho Patachoca e elogiaram a FAB,
por conservá-lo tão bem, em que pesem os
40 anos de emprego operacional.
A solenidade de despedida do último Catalina, estava
marcada para a véspera, dia 18, mas um
pequeno detalhe, na pressão do óleo de um dos trens de pouso, levou ao
adiamento da viagem. O que não impediu o sobrevôo do C-10, 6525 sobre Belém, já
com as cores da Airplane Sales
International Corp., de Santa Mônica/Califórnia, que o comprou. Naquela ocasião, se
pode ler sob o bojo do avião, “Adeus FAB, Adeus Brasil”.
É quase impossível a um Catalineiro descrever esse fato histórico da aviação brasileira e particularmente da Amazônia, sem se emocionar. Especialmente ao lembrar que a despedida do último Catalina se deu exatamente, na véspera do dia 20 de julho, data de aniversário de Santos Dumont, patrono da Força Aérea Brasileira.
É quase impossível a um Catalineiro descrever esse fato histórico da aviação brasileira e particularmente da Amazônia, sem se emocionar. Especialmente ao lembrar que a despedida do último Catalina se deu exatamente, na véspera do dia 20 de julho, data de aniversário de Santos Dumont, patrono da Força Aérea Brasileira.
A
importância social dos Catalinas para as comunidades ribeirinhas da Amazônia,
seja nas operações militares da FAB seja na exploração comercial da linha aérea pela
Panair do Brasil, me motiva a escrever um romance em que
se conte a saga dos Catalinas, lance luzes sobre esse período da nossa História
ainda obscuro e se traga a público o real significado da presença
dos Catalinas, na Amazônia.