sexta-feira, agosto 30

O MEU MAFUÁ DO MALUNGO





                O “culpado” por essa crônica é o meu colega jornalista Elias Ribeiro Pinto, que me introduziu na literatura de Haroldo Maranhão. Sim, eu conhecia Haroldo por saber de sua obra, mas nunca havia lido uma delas.

No embalo da leitura da coluna literária do Elias, fui na abertura da Feira Pan-Amazônica do Livro e Multivozes e me dirigi diretamente ao estande da Imprensa Oficial do Estado do Pará, onde comprei o livro Flauta de Bambu, do Haroldo Maranhão, reeditado pela IOEPA e prefaciado por Elias, um lutador pela preservação da literatura amazônica e O Último dos Moicanos da crítica literária no jornalismo brasileiro. 

Leitor voraz, ali mesmo na Feira comecei a me deliciar com a obra haroldiana.  Dentre tantas primorosas chamaram-me atenção especialmente duas crônicas que se completam aliás um estilo do autor, inaugurar um assunto numa crônica e dar-lhe continuidade na subsequente.

Pois bem, nessas duas crônicas o autor narra o sumiço de um livro que ele tanto prezava. Até por conter autógrafo do autor, um poeta de renome nacional e internacional que Haroldo admirava a ponto de visitá-lo sempre que ia ao Rio de Janeiro.  

Foi esquecimento, furto de uso, má fé, apropriação indébita ou tudo isso junto? O leitor decidirá quando saborear o Flauta de Bambu. Só que depois de anos Haroldo, usando inteligente estratégia, conseguiu tê-lo de volta.  A estratégia? você saberá ao ler o livro.  
         
       Esse fato narrado por Haroldo Maranhão acendeu em mim uma terna saudade. Fez-me lembrar situação semelhante que eu vivi e ainda vivo.

Foi nos anos 80. Vivia-se no Brasil o processo e abertura política e o prenúncio do fim da ditadura de 64. Então, os jornalistas Raymundo Pereira e Mino Carta lançaram uma série de fascículos a que deram o título de Retrato do Brasil. Nesses fascículos, a História do Brasil foi narrada à luz do materialismo histórico desde o Império até aquele precioso momento da redemocratização do país que eu ainda jovem como tantos outros, vivi e participei. (Pena que as conquistas alcançadas correm sério risco de irem para a lixeira da História, na presente quadra da vida nacional). 
   
         Mas sim, desde a leitura do projeto do Retrato do Brasil eu compreendi o quanto ele ia ser interessante especialmente como fonte de pesquisa nos tempos futuros. Por isso, toda semana eu ia até a banca de revista próxima ao meu local de trabalho, adquiria o meu fascículo, lia avidamente e guardava com todo carinho. Suprema glória pra mim foi quando concluídos os capítulos, eu recebi as capas duras para os textos, para as entrevistas com quase todas as figuras da política e economia brasileiras que concorreram para o processo de abertura do regime. Esse volume das entrevistas era de menor tamanho. E além disso havia o box para guardar os gráficos de demonstrações estatísticas dos assuntos tratados.

         Retrato do Brasil era a obra de maior valor histórico e afetivo de minha biblioteca pessoal. Só que a minha boa vontade de ajudar levou-me a emprestar ora para um ora para outro, às vezes um volume, outras vezes a coleção toda. Lembro-me muito bem de uma aluna da UFPA, salvo engano do curso de Ciência Política, que ao devolver-me os volumes, emocionada me disse que a nota máxima que alcançara devia-se muito à leitura daquela obra. Outras vezes emprestei o meu tesouro e devo dizer que, a essa época, era um verdadeiro entra e sai de pessoas no meu escritório. O fato é que um belo dia me deparei com a ausência da minha amada coleção. Ainda cheguei a perguntar a algumas pessoas mas todas me responderam não estar com elas. Com muita pena me resignei a não mais ver aquela que foi a obra mais cara.
   
         Pois é. A leitura das crônicas História do Meu Mafuá e a seguinte O “Mafuá do Malungo”, de Haroldo Maranhão, no gostosíssimo livro Flauta de Bambu me trouxeram à mente esse fato triste da minha vida de eterno aprendiz. Aí eu fico pensando será que terei a mesma sorte que teve Haroldo com sua estratégia, usando os recursos da época? Bom, os tempos são outros, os recursos de comunicação incomparavelmente mais eficientes e eficazes.

O resto é com você que tomou emprestado minha coleção e esqueceu de devolver. Devolva-me mesmo com esse não pequeno atraso e faça um seminovo rsrsrs feliz.
                 


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