domingo, março 24

CULTURA PARAENSE FORA DO EIXO


Viviane Menna Barreto explica o projeto e o programa


Lançado, no sábado passado, o projeto Barco Fora do Eixo, com a presença de artistas e intelectuais de Belém. O Barco Fora do Eixo é um veículo catalizador que, percorrendo as águas da Amazônia, visa o intercâmbio de informações e busca fomentar as ações que já se realizam em cada localidade. Esse projeto faz parte do Programa “Ligando os Pontos”, que objetiva fazer das comunidades ribeirinhas, pontos ativos de conexão, troca e intercâmbio de saberes, enfim, proporcionar condições para que as comunidades sejam efetivamente, protagonistas do local em que se situam, cada localidade integrando uma grande rede de cultura e formação.  

Zezinho Viana, do Grupo Sancari
O “Ligando os Pontos” é uma realização da Casa Fora do Eixo Amazônia, em parceria com o Núcleo de Criação e Cartografias Culturais da Faculdade Estácio – FAP e com o Serviço Federal de Processamento de Dados- Serpro.



O Circuito Fora do Eixo:

         A Casa Fora do Eixo Amazônia, coordenada por Michelle Andrews, é o ponto de articulação, formação e sustentabilidade, na Região Norte, do Circuito Fora do Eixo, que é uma rede de trabalhos, concebida fora do eixo Rio/São Paulo, fruto da  criatividade de produtores culturais das regiões centro-oeste (Cuiabá-MT e Uberlândia-MG), norte (Rio Branco-AC) e sul (Londrina-PR), no final de 2005, quando estabeleceram parceria objetivando a circulação de bandas, o intercâmbio de tecnologia de produção e o escoamento de produtos, originando o que foi chamado de Circuito Fora do Eixo.

          No curto prazo, o Circuito Fora do Eixo cresceu vertiginosamente. A rápida ampliação do circuito foi facilitada pelo avanço tecnológico, que proporciona a todas as pessoas, possibilidade de acesso à informação, estimula relações de mercado favoráveis às pequenas iniciativas do setor musical, aos miniempreendimentos, especialmente os mais cooperativos e, por consequência, impõe desafios à indústria fonográfica. Festivais proliferaram em toda a rede, evidenciando a validade da produção em escala autossustentável, com base no contato direto entre produtores de diferentes Estados, por meio de uma rede de informações, que estimula a união de pequenos em prol de grandes ações. 

           Todos os Estados das regiões norte, centro-oeste, sudeste e sul já estão ligados ao Circuito Fora do Eixo, que já existe em 25 dos 27 Estados brasileiros, espraiando-se para outros países da América Latina. Por exemplo, no Grito Rock América do Sul, realizado em 2010, além das 70 cidades brasileiras presentes, participaram também, 4 cidades da Argentina, da Bolívia e do Uruguai.

           Passo definitivo, na afirmação do circuito, foi o II Congresso Fora do Eixo, realizado em Rio Branco, Acre, em setembro de 2009. Na ocasião foi discutida e aprovada a Carta de Princípios do Circuito Fora do Eixo, que o definiu como uma rede colaborativa e descentralizada de trabalho, constituída por coletivos de cultura espalhados por todo o Brasil, pautados nos princípios da economia solidária, do associativismo e do cooperativismo. E também, da divulgação, da formação e intercâmbio entre redes sociais, do respeito à diversidade, à pluralidade e as identidades culturais. Além disso, o fortalecimento dos sujeitos, a busca da autonomia quanto às formas de gestão e participação em processos socioculturais e o estímulo à autoralidade, à criatividade, à inovação e à renovação. E ainda, a democratização quanto ao uso e compartilhamento de tecnologias livres, aplicadas às expressões culturais e à sustentabilidade pautada no uso de tecnologias sociais.

         Outro fato definitivo, para a afirmação do circuito, foi a implantação do Portal Fora do Eixo, por meio do que o circuito passou a ocupar espaços melhor estruturados na web, facilitando o acesso do público ao grande banco com informações de todo o país.

         A organização política do Circuito Fora do Eixo comporta entidades de três categorias. Na categoria 1, situam-se os Pontos Fora do Eixo, que são organizações sem fins lucrativos com laboratórios integrados oficialmente à rede. As Casas Fora do Eixo são residências culturais que possuem todos os aplicativos avançados instalados em sua plataforma. Também na categoria 1, situam-se os Parceiros, pessoas e organizações, sem e com fins lucrativos, que tem relações de parceria com os coletivos da rede. Na categoria 2 estão os Colegiados Regionais, que são os Conselhos Gestores de Redes locais, estaduais e regionais. Nesse nível também se situam, as Frentes e Simulacros, constituídas pelas redes temáticas artísticas e socioculturais e também, as Casas Regionais -  residências culturais que possuem todos os aplicativos avançados instalados em sua plataforma e são responsáveis pela gestão das regionais. Finalmente, na Categoria 3, situa-se o PAN - Ponto de Articulação Nacional,  formado por moradores de casas, membros de colegiados regionais e gestores de frentes e simulacros e a Agência de Cooperação Internacional, Conselho responsável pela gestão das relações internacionais.



         O Circuito Fora do Eixo está presente em Belém, há mais de cinco anos e, desde cinco meses atrás, o ponto fora do eixo de Belém tornou-se a Casa Fora do Eixo Amazônia. Situada na Rua Aristides Lobo, 292 (entre Padre Prudêncio e 1º. de Março), no bairro da Campina, funciona 24 horas por dia, como sede, moradia e hospedaria. Já realizou diversos outros projetos, destacando-se o Circuito Amazônico de Festivais Independentes, o Grito Rock, A Semana do Audiovisual – SEDA, e o evento Cenários Possíveis à MIVA (Mostra Internacional de Videodança na Amazônia)


Casa Fora do Eixo Amazônia, em reunião.

         Saiba mais sobre o Circuito Fora do Eixo, acessando http://foradoeixo.org.br/

O Núcleo de Criação e Cartografias Culturais da Faculdade Estácio – FAP:

      
            Dirigido pela professora Viviane Menna Barreto, o Núcleo de Criação e Cartografias Culturais da Faculdade Estácio – FAP é o agente provocador do programa “Ligando os Pontos”. Com o programa, a Instituição de Ensino coloca em prática seu compromisso de formar cidadãos conscientes e profissionais qualificados às competências exigidas pelo atual mercado de trabalho e cumpre sua responsabilidade social, por meio da integração das comunidades em que atua com seus alunos e corpo docente, buscando estimular a produção de conhecimento, a geração e troca de ideias e promover o senso de cidadania e autonomia da comunidade.       


        Viviane, que é casada com um paraense que morava em São Paulo, viaja pelos rios paraenses, desde 1999. Inicialmente, ela buscava, como artista visual, encontrar cores e visualidades amazônicas, para sua pintura, o que a levou a acompanhar por 12 anos, o projeto  IFNOPAP, da UFPA, que pode ser compreendido como projeto campus flutuante. Por ele,  anualmente, pessoas das mais variadas formações embarcam em um navio que se desloca ao longo da bacia amazônica por cerca de uma semana. Durante a viagem sucedem-se eventos científicos e culturais, que se desdobram em determinados pontos de desembarque, nos quais há interação com as populações ribeirinhas.

            Formada em Comunicação, Viviane tornou-se, em 2005, mestra em Comunicação e Semiótica, pela PUC/SP, com a dissertação “Mapa Pictográfico da Cultura Ribeirinha da Amazônia Paraense: Tradições e Mídias”, que tem como carta de itinerário o ciclo de festas populares dos caboclos ribeirinhos da Amazônia paraense e propõe a criação de um novo conjunto de imagens sobre a Amazônia e, através da divulgação nos meios de comunicação, a inserção dessas paisagens, no imaginário do resto do Brasil. O diferencial da dissertação são as duas vias que confluem para o mesmo ponto, saindo da artista e pesquisadora e seguindo infinitamente, enquanto representação plástica, construída através de uma grande viagem, pelas comunidades caboclas.

            A partir do universo conceitual de Jerusa Pires Ferreira, orientadora de sua tese de mestrado, Viviane, fundamentada em autores do porte de Ana Maria de Morais Beluzzo, Darcy Ribeiro, João de Jesus Paes Loureiro, Bakhtin e Marlyse Meyer, ampliou o universo do festeiro, retirando-o do localismo e redimensionando-o na universalidade. Sem pensar teoricamente com aparelhos estáticos, mas sim, de tal forma, que a teoria propicie a deslocação do olhar através da própria obra pictórica de Viviane, encarada como veículo de comunicação entre esses dois mundos. Assim, em sua tese, a pesquisadora discutiu a possibilidade de criação e difusão de redes imagéticas, através de projetos artísticos midiatizados que mostrem o imaginário das minorias. A partir da análise da mudança dos papéis sociais dos festeiros, Viviane exemplifica processos de atualização de uma tradição, por meio do carnaval de Juaba, em Cametá, e do Boi de Máscara, de São Caetano de Odivelas. As conclusões mostram como a comunidade festeira cria um território encantado e como o artista-viajante, midiatizando sua voz, amplia seu alcance.

            Após a defesa de sua dissertação de mestrado, Viviane paraensou de vez. Passou a morar em Belém, continuou suas expedições fluviais e decidiu também, aproximar as três filhas, dos costumes da região do marido, Nelson Vilhena, experiente em montagem de bienais e outras mostras, que acompanha a família, pesquisando e montando as exposições da esposa. "Meu sogro também se envolveu e está patrocinando meu projeto. Comprou um barco, no qual estou montando um ateliê.", diz ela.

           Em 2008, entrou para a FAP Estácio, onde leciona várias disciplinas, como cultura e teorias da comunicação. Já foi coordenadora do curso de Publicidade e Propaganda e hoje coordena o Núcleo de Criação e Relações Externas, o que lhe possibilita oportunidade para criar vários projetos. Nessa atividade, tem trabalhado com universitários, temas relativos a diversidade cultural, estimulando-os a conhecer e amar a Amazonia e a criar narrativas fotográficas, textuais e visuais sobre a cultura amazônica.

        Para Viviane, o programa “Ligando os Pontos” se propõe a fazer conexões entre realidades e costumes das localidades, em função de um mapeamento fluvial, das atividades que acontecem nas comunidades, desse “verdadeiro emaranhado de caminhos e vias que cortam as florestas, formando um grande mosaico de estradas fluviais que fazem da Amazônia uma grande plataforma de experiências e ressignificações pois, na beira das “estradas d’água”, existem diversas cidades e comunidades repletas de ações que revelam a riqueza do Brasil profundo”.

            Exemplo disso é o projeto de aproximação com as comunidades remanescentes dos quilombos Santa Maria, de Itacoã-Miri, e Guajará-Miri, no município do Acará, situadas no estuário do rio Pará, no vale do rio Guamá. Nesse ponto, ressalta a pesquisadora, os quilombos não devem ser definidos por fatores biológicos ou raciais, uma vez que eles não eram formados  apenas por negros descendentes de escravos, mas também, por índios, mestiços e brancos, que constituíam coletividades com história baseada numa cultura própria, transmitida e adaptada a cada geração. Os membros dessas comunidades se identificam entre si, como pertencentes a um mesmo grupo que compartilha elementos e ações culturais, num território comum a todos.

            Outro exemplo é a etapa Cametá-Juaba do projeto de conexões e cartografias amazônicas, que tem toda uma programação a ser cumprida, neste ano e em 2014. No próximo mês de julho, está previsto o Festival Juabense de Cultura, com exposição itinerante de máscaras do Cordão Última Hora – Carnaval das águas, lançamento do documentário “Águas Amazônicas”, exposição fotográfica e pictórica, oficinas “Gestão de Coletivos Culturais”, “Técnicas Musicais para Instrumentos de Sopro”, “Iniciação ao Teatro”, “Coreografia”, “Cobertura Colaborativa e Mídias Livres” e “Inclusão Digital”. 

 O SERPRO e seu Programa de Inclusão Digital:

        A operacionalização do suporte de informática, do Programa “Ligando Os Pontos”, é feito pelo Serpro, por meio do seu Programa de Inclusão Digital- PSID, que é coordenado no Pará, por José Ricardo Macedo de Carvalho. 

           Por meio desse Programa, o SERPRO busca promover a inclusão digital e social das comunidades excluídas do universo das Tecnologias da Informação e Comunicação- TIC.

            O Serviço Federal de Processamento de Dados – SERPRO, maior empresa de TIC da América Latina, utiliza sua expertise tecnológica e seu compromisso social nesse projeto de uso intensivo da tecnologia da informação, para ampliar a cidadania e combater a pobreza, visando garantir a inserção do indivíduo na sociedade da informação e o fortalecimento do desenvolvimento local.
Implantado em 2003, o PSID é uma das ações amparadas pela política de responsabilidade social e cidadania da empresa, em sintonia com o Programa Brasileiro de Inclusão Digital, do Governo Federal, que se concentra em dois eixos principais. Primeiro, a utilização efetiva do software livre, viabilizando seu uso e apropriação das novas tecnologias pela sociedade. Segundo, o atendimento das necessidades das comunidades na formulação de políticas públicas, na criação de conhecimentos, na elaboração de conteúdos apropriados e no fortalecimento das capacidades das pessoas e das redes comunitárias.

           Dentre as ações desenvolvidas pela coordenadoria de inclusão digital do SERPRO, destaca-se a montagem de telecentros comunitários, o que proporciona à várias localidades do Brasil, o acesso ao universo tecnológico e ao mundo da informação.

         É no exercício dessas ações que se situa o papel do SERPRO, na realização do Programa “Ligando os Pontos”, em parceria com a Casa Fora do Eixo Amazônia e o Núcleo de Criação e Cartografias Culturais da Faculdade Estácio – FAP, de que o Barco Fora do eixo é um dos projetos.