segunda-feira, agosto 12

Manifestações cívicas, reações governamentais e redes sociais distribuídas.

Configuração de uma rede social distribuída

             Desde o mês de junho deste ano, vive-se uma situação inusitada em nosso país. Milhares de pessoas protestando em praça pública, patrimônio público e privado sendo depredado por forças radicais e infiltradas nas manifestações, governantes atônitos dando respostas embasadas em paradigmas ultrapassados, segmentos políticos tentando tirar dividendos da situação, acirramento de ânimos e observadores estupefactos diante dos efeitos da mobilização provocada por uma estrutura pouco ou nada estudada, a rede social distribuída.

       Viciados à gestão pachorrenta e autoritária, os governos estaduais, no primeiro momento, bestificados com os acontecimentos, optaram por  “endurecer” contra os manifestantes, afirmando que não cederiam às pressões para revogar o aumento de transporte coletivo, ponta do iceberg da pauta de reivindicações das massas. Pressionados pela extensão e intensidade das manifestações, resolveram esses governos, “entregar os anéis, pra não perderem os dedos”. Revogaram os aumentos concedidos. Mais aparvalhados ficaram, ao verem que, mesmo com a reivindicação atendida, as mobilizações não só  continuaram, se acentuaram.

        Entrou então, em cena, o governo federal. Inicialmente, tentando  apropriar-se das bandeiras do movimento cívico e utilizá-las em benefício do projeto de poder do atual governo. Primeiro, buscou impingir à Nação, a convocação de uma Constituinte exclusiva para promover a reforma política do país. Proposta rechaçada pelos próprios parceiros da sua base de sustentação, que evidenciaram a inconstitucionalidade da convocação pretendida. Tentou então, o governo federal, fazer passar um plebiscito para ter efeitos ainda, nas eleições do próximo ano, ou seja, “mudemos, mas conosco dizendo o que e de que forma”. Pretensão de aprovação inviável, ante o número insuficiente de parlamentares da base aliada, para enfiar “goela a baixo” a proposta  governamental. Aliás, base aliada cada dia mais infiel, com os olhos voltados para as eleições de 2014.

          Ante as duas derrotas, o governo federal, orientado pelos marketeiros do Planalto, “pinçou” uma das principais reivindicações das manifestações públicas, a solução para o caos da saúde pública brasileira, e adotou o programa “Mais Médicos Para um Brasil Melhor”. Mais um equívoco.

          O programa é inequivocamente de elevado apelo midiático. Veja-se o quanto a propaganda é veiculada,  nos meios de comunicação. E, ao pretender solucionar a questão, buscando “na marra”, ampliar o número de médicos, inclusive com a “importação” de médicos estrangeiros, sem revalidação de seus diplomas no Brasil, entrou o governo, em rota de colisão com a categoria profissional tradicionalmente injustiçada, a dos médicos. Seja pelos baixos salários, seja pela total falta de condições de trabalho. Além de pretender a ampliação do curso de medicina, de 6 para 8 anos, com a obrigatoriedade de os formandos em medicina, atuarem por 2 anos no SUS. 

      Todos sabemos que a situação caótica da saúde pública brasileira decorre da falta de estrutura. E também, da corrupção que grassa nos governos que utilizam o setor saúde para fazer políticalha, em face do volume de recursos alocado ao ministério específico. É só atentar para quais os ministérios são mais disputados pelos partidos políticos, nas composições de governo. Os “olhos gordos” sobre o ministério da saúde não são por vontade de solucionar a situação drástica da saúde pública brasileira, mas porque ali "rola"muito dinheiro.

          Medidas emergenciais são necessárias. Mas não é aumentando artificialmente o número de médicos nem propagandeando os hipotéticos benefícios do programa, que se dará uma resposta satisfatória à questão da saúde. É preciso investir maciçamente na infraestrutura dos postos e hospitais públicos, dotando médicos e paramédicos (enfermeiros, nutricionistas, psicólogos e outros) de condições de trabalho. 

         Para se ter saúde, suprema ironia, é preciso também investir em segurança. Centenas de profissionais da saúde já foram assaltados e violentados, dentro de postos e hospitais. Também, aumentar atabalhoadamente os salários dos médicos, importar médicos estrangeiros, que desconhecem a realidade onde vão trabalhar e sequer falam a nossa língua, jamais serão soluções, se não houver investimento na infraestrutura.  O programa pode até agravar um quadro que já é caótico. Vejam-se os municípios que oferecem até R$ 30.000,00 de salário para médicos e, ainda assim, as vagas continuam não preenchidas. Nenhum profissional responsável embarca em aventura. Sabe ele de antemão, que vai lutar com estrutura deficiente que inviabiliza uma ação minimamente satisfatória. 
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          Também, se se quer efetivamente cuidar da saúde e não da doença, há que se investir em saneamento básico. A falta de saneamento em todas as cidades brasileiras, pequenas médias ou grandes, é responsável por significativa parcela dos doentes que chegam aos postos e hospitais. Mas nenhum governo investe em saneamento porque “não rende voto”, como dizem as cobras criadas do nosso carcomido mundo político “saneamento vai pra baixo da terra. O povo não vê. É melhor levantar postes e prometer a chegada da luz”.

          São muitas as questões estruturais que precisam ser atacadas de frente, sem  demagogia. Mas o stablishment, o status quo não responde a essas questões. Os poderes públicos encastelam-se em esferas que constroem para si próprios, dificultam o acesso de quem os elegeu e debatem-se na luta pela  manutenção no poder. O que explica perfeitamente a queda de aprovação de governantes e instituições, e o cansaço da cidadania com esse quadro que é mantido pelo cidadão enquanto contribuinte, no país campeão de carga tributária e de falta de retorno dos recursos arrecadados.

    Foi contra essa realidade, penso eu, que as massas foram às ruas  protestar. Não oferecendo respostas concretas, objetivas e não demagógicas, os governos alimentam as condições para a mobilização cívica em busca de soluções e também, para a distorção do movimento, com a infiltração de segmentos como o crime organizado e outros a quem não interessa a transparência e o regime democrático efetivamente participativo.

       O que atordoa mais os governos, é a presença de um elemento fluido, difuso, não identificado, no processo de mobilização de massas. As redes sociais distribuídas, que nada tem a ver com orkuts, facebooks, twitters e outros afins, que no máximo, podem funcionar como instrumentos desencadeadores dessas redes. Redes sociais distribuídas são as que se formam entre pessoas, podendo cada pessoa ou cada nodo de rede, na terminologia técnica, interagir com todas as demais pessoas ou nodos desta ou daquela rede social distribuída.


       É interessante se ter presente que toda rede se forma entre pessoas, sendo o sinal de fumaça, o pombo coreio ou a internet, dependendo do momento histórico, instrumentos utilizados pelas pessoas que interagem entre si, numa rede, sem lideranças ou "igrejinhas” a controlá-la, característica básica da rede social distribuída. 

     A ausência de estrutura formal ou de lideranças permanentes deixa as organizações piramidais, especialmente os paquidérmicos governos, perdidos como “cego em tiroteio”, pois não tem quem identificar, para cooptar, corromper ou simplesmente "desaparecer".  

      Na ilustração abaixo, diagrama de uma rede social centralizada, própria das estruturas burocráticas, de uma rede social descentralizada, onde o poder é compartilhado entre "líderes" e finalmente, de uma rede social distribuída.

[Em breve, artigo específico sobre redes sociais distribuídas]


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