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sexta-feira, agosto 28

NÃO À TAXAÇÃO DO LIVRO


Octávio Pessôa

 

         Os autores de livros e o mercado livreiro entram na alça de mira do governo federal pelo Projeto de Lei 3.887/2020 que cria a obrigatoriedade de o segmento pagar 12% a título de Contribuição Social sobre Operações de Bens e Serviços, a CBS. A proposta legislativa fere de morte a isenção do pagamento de impostos pelo livro, prevista no artigo 150 da Constituição Federal atual e presente desde a carta constitucional de 1946 para o papel utilizado na produção de livros e revistas, o que proporcionou livros mais baratos e acesso de maior parcela da população à cultura e ao conhecimento.  

         Essa tentativa de retrocesso ocorre quando a média anual de leitura, no Brasil, é de 4,96 livros por pessoa. Enquanto isso, os franceses leem 21 livros por ano, los hermanos argentinos leem 5,54 e na decadente Venezuela esse índice é de 6,64, segundo a Biblioteca Parque Villa Lobos.

         Para o ministro da economia, Paulo Guedes, a isenção tributária do livro no Brasil beneficiaria apenas quem mais pode pagar impostos. Ele argumenta que para compensar o fim da isenção, o governo poderia aumentar o valor do atual Bolsa Família ou mesmo cogitar de um programa de doação de livros.  

         A questão não é assim. A eventual aprovação da tributação de livros é um prejuízo não apenas para o segmento da editoria, mas para todo o Brasil, nas palavras do senador Jean Paul Prates, presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Livro, para quem a média de leitura per capta no Brasil é irrisória. Esclarece ainda o parlamentar, sendo em torno de 10% a média em direitos autorais pagos a um escritor, embolsando o governo 12%, ele vai ganhar mais que o autor. Enquanto bancos, financeiras e planos de saúde pagam apenas 5,9%.   

         O sugerido programa de doação de livros à camada menos favorecida da população é questionável, para dizer o mínimo. É uma tática que permite manipulação na escolha de conteúdo, um risco muito grande de seleção de obras a serem beneficiadas apenas segundo o talante do governo de plantão.  O que vai na contramão do princípio que orientou a inserção da imunidade tributária do livro na carta constitucional brasileira– o de facilitar o acesso à cultura e garantir a liberdade de expressão.

 

         A tentativa de acabar com a imunidade tributária do livro no Brasil, por suas consequências danosas, está na ordem do dia.

         No manifesto Em Defesa do Livro, a Associação Brasileira de Editores e Produtores de Conteúdo e Tecnologia Educacional (Abrelivros), a Câmara Brasileira do Livro (CBL), o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel) e outras entidades representativas do setor criticaram a tributação sobre livros, evidenciando que “não será com a elevação do preço do livro – inevitável diante da tributação inexistente até hoje – que se resolverá a questão.

         No âmbito local, li a lúcida manifestação do professor Armando Alves Filho, doutor em História e proprietário da Editora Paka-Tatu, responsável pela edição de parcela expressiva dos títulos atualmente produzidos no Pará, em que ele esclarece o retrocesso para o segmento a eventual aprovação da proposta encaminhada pelo governo para o Congresso Nacional.  

         Como escritor, coloco-me ao lado dos meus pares que reprovam a tributação do livro. Sabemos todos, como disse Maurício Gomide em entrevista à TV Senado, o mercado editorial já é muito difícil e a conta da tributação certamente irá para o preço do livro. Espera-se assim, que essa proposta seja barrada no Congresso Nacional.

Concluo ratificando as palavras da colega jornalista e escritora Hulda Rode “O livro é essencial para a humanidade: muda mundos, muda realidades e aproxima continentes. O Imposto trará redução do acesso ao conhecimento, à cultura e à leitura”.

 

 

 


segunda-feira, maio 31

APROVADO O "FICHA LIMPA", QUAL O PRÓXIMO PASSO?

A aprovação pelo Congresso Nacional, do primeiro projeto de lei de iniciativa popular no Brasil, o “”Ficha Limpa”, foi uma vitória da cidadania brasileira.
Uma iniciativa do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral- MCCE, que é a articulação de quarenta e quatro entidades da sociedade civil brasileira, o “Ficha Limpa” vai alterar a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, a Lei das Inelegibilidades. Tudo agora está nas mãos de Lula, a quem compete sancionar o projeto, tornando-o uma lei.
Pela nova lei, não poderão se candidatar os condenados por crimes contra a economia popular, a administração pública, o patrimônio privado e o meio ambiente e os crimes previstos na legislação anterior, como os eleitorais e o tráfico de entorpecentes. O prazo de inelegibilidade passa a ser de oito anos e a grande novidade é que uma decisão judicial colegiada ainda não transitada em julgado (irrecorrível) poderá inviabilizar uma candidatura ou, se eleito o candidato, o exercício do mandato político. A dúvida quanto à aplicabilidade da nova lei às eleições deste ano, propósito do projeto, será uma decisão da Justiça Eleitoral.
A aprovação no Congresso, como era de se esperar, foi tensa e difícil. Até porque a nossa elite dominante e as forças conservadoras apostaram inicialmente no insucesso da iniciativa. Quando “caiu a ficha” quanto aos efeitos da mobilização social, esses setores relutaram em aceitar, temendo pelo fim dos privilégios mantidos pelo corporativismo dos congressistas. O projeto, acompanhado das um milhão e trezentas mil assinaturas exigidas pela Constituição Federal (1% do eleitorado brasileiro), foi entregue, na Câmara Federal, em 29 de setembro do ano passado. Excluindo-se o mês do recesso parlamentar, foram seis longos meses de indecisão quanto à inclusão do projeto em pauta, como matéria de tramitação prioritária.
O importante é que, a cidadania mobilizou-se pela Internet, para conseguir as assinaturas necessárias, num primeiro momento, e depois, na pressão sobre os parlamentares para a aprovação do projeto.
Estabeleceu-se entre os cidadãos mobilizados um clima de crowdsourcing, fenômeno que se dá entre pessoas que se utilizam da Internet, para criar conteúdo, resolver problemas e até trabalhar em projetos de pesquisa e desenvolvimento. Jeff Howe, em sua obra “O Poder das Multidões – porque a força da coletividade está remodelando o futuro dos negócios”, ressalta que, embora o crowdsourcing esteja mesclado com a Internet, sua essência não é a tecnologia, mas os comportamentos humanos que a tecnologia engendra, especialmente porque a Internet tem o potencial de interligar a massa da humanidade em um organismo próspero e infinitamente poderoso. “O crowdsourcing pinta um retrato lisonjeiro da raça humana”, diz Jeff.
O crowdsourcing é um conceito próprio das redes sociais distribuídas- aquelas em que, pessoas com interesses em comum utilizam a Internet como instrumento, para a troca de conhecimentos e a busca de resultados. Numa rede social distribuída, todas as pessoas, que são os nodos da rede, estão num mesmo plano, podendo cada uma delas interagir com cada uma das demais, inexistindo qualquer ordem hierárquica entre elas. Conheça mais sobre o assunto, acessando o site da Escola de Redes, http://escoladeredes.ning.com/.
A mobilização da cidadania brasileira alcançou resultado. O projeto aprovado, tornando-se lei, será um passo decisivo para a depuração do Congresso Nacional. Os péssimos parlamentares, especialmente os que, através da compra de votos, conquistam um mandato popular para se protegerem das punições dos crimes que cometeram, passarão a ter menos espaço para continuar na “política”. E lideranças éticas e comprometidas com as questões cruciais da Nação, poderão encontrar motivação para vida pública, nos parlamentos.
A vitória, no entanto, nos coloca diante de uma questão: qual o próximo passo? Qual a nova meta dos cidadãos que nos mobilizamos em torno do projeto “Ficha Limpa”? O que não devemos é nos dispersar.
A rede de mobilização global AVAAZ.ORG, “o mundo em ação” (www.avaaz.org), já realizou pesquisa nesse sentido e levantou os diversos temas que merecem nossa atenção e mobilização. Já está em curso uma nova campanha. Dessa feita, em favor da preservação do Código Florestal brasileiro, que está em risco descaracterização, para se dizer o mínimo, no Congresso Nacional.
Se quisermos “acabar com a brecha entre o mundo que temos e o mundo que queremos”, vamos manter nossa mobilização em torno da nova meta e de outros desafios futuros.

OCTAVIO PESSOA
*Advogado, jornalista e auditor federal de controle externo.
Acompanhe-me pelo Twitter: http://twitter.com/OCTAVIOPESSOAF

quinta-feira, maio 6

Transparência na Administração Pública – Os Efeitos da Lei Complementar 131/2009

Todos os municípios com mais de 100 mil habitantes, além da União, dos Estados e do Distrito Federal, estão obrigados a ter o seu Portal da Transparência, a partir de 28 de maio deste ano. Na data, completa um ano da publicação a Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009.

Essa Lei Complementar acrescentou dispositivos que determinam a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, à Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 200, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal. Que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências.

A mencionada obrigatoriedade decorre do inciso I do Artigo 73-B, introduzido pelo Artigo 2º da LC 131/2009, na LRF. Mas a obrigatoriedade não pára por aí. A partir de 28 de maio de 2011, ela se estende aos municípios que tenham entre 50 mil e 100 mil habitantes (inciso II). E a partir de 28 de maio de 2013, os municípios de até 50 mil habitantes terão que ter o seu Portal da Transparência (inciso III).

Os instrumentos de transparência e gestão fiscal são definidos no artigo 48 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Na redação original, seu parágrafo único rezava que “A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos”. Pela redação introduzida pela LC 131/2010, o conteúdo do parágrafo único foi explicitado em 3 incisos.

Passou a rezar o parágrafo único do Artigo 48 que a transparência será assegurada também mediante: I- incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos; II- liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso ao público; adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no artigo 48-A.

O Artigo 48-A preconiza que, para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do artigo 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a: I-Quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado; II- quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários.

Pelo Artigo 73-C, se até 28 de maio de 2011, os municípios com população entre 50 mil e 100 mil habitantes, e até 28 de maio de 2013, os que tenham até 50 mil habitantes, não criarem seus Portais da Transparência, eles sofrerão a sanção prevista no inciso I do § 3º do artigo 23 da LRF - não poderão receber transferências voluntárias.

Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal de contas e ao órgão competente do Ministério Público, o descumprimento da Lei. É o que dispõe o Artigo 73-A introduzido na Lei de Responsabilidade Fiscal pela Lei Complementar nº 131/2009.

Exerça sua cidadania. Fiscalize. Denuncie. Replique esta informação.

Octavio Pessôa – advogado, jornalista e auditor federal de controle externo

Acompanhe-me pelo Twitter: http//twitter.com/octaviopessoaf .

O Controle Externo – Atividade de Estado, Ação Cidadã (Publicado no Diário do Pará, de 21/10/2009)

Nunca o Tribunal de Contas da União esteve tão evidente na mídia. As campanhas movidas contra ele compreendem-se pelo adágio “ninguém chuta em cão morto”.
O TCU passa por irreversível processo de aprimoramento, há algum tempo. As últimas gestões investiram massiçamente no avanço tecnológico, na renovação e qualificação de seus quadros e no aperfeiçoamento institucional.

Quinhentos novos servidores entraram no Tribunal, desde 2002, via concurso público. Em grande parte, jovens da chamada Geração Y- a que brincou em videogames e computadores. Formados nas melhores escolas brasileiras, buscam resultado em suas ações.

Pelo convênio firmado com a Fundação Dom Cabral e apoio da Pricewaterhouse Coopers, o TCU adotou o modelo de gestão de pessoas por competência, realizou seu Balanced Scorecard, analisando sua realidade, projetando a desejada e aperfeiçoando seu Plano Estratégico. Junto com especialistas, mapeou e validou o perfil profissional de seus gerentes e as competências técnicas dos servidores. Secretários e diretores passaram a submeter-se ao Programa de Liderança e Gestão Sustentável e todo funcionário, ao Programa de Desenvolvimento de Competências Técnicas.

Esse é o TCU que busca cumprir sua missão institucional de zelar pela regular aplicação dos recursos públicos em benefício da sociedade, lutando pelo melhor uso do meu e do seu dinheiro.

O relatório das obras fiscalizadas pelo TCU com indícios de irregularidades, que subsidia a decisão do Congresso quanto à inclusão de obras na próxima Lei Orçamentária Anual, colocou o Tribunal na “linha de fogo” do governo. Este, com evidentes sintomas de TPE – Tensão Pré-Eleitoral, viu pretensão de determinar-lhe o que fazer ou não fazer. Não é assim.

O Tribunal, diante de irregularidades graves, pede informações ao gestor e adota todas as medidas para não prejudicar o andamento e só em situações extremas recomenda a paralisação de obras. O bloqueio só é proposto quando há indícios de irregularidade grave, como prejuízo aos cofres públicos ou de terceiros, nulidade em procedimento licitatório ou desvio a princípios, como o da moralidade. Se cumpridas as determinações do TCU, contratos bloqueados podem ser liberados para receber recursos públicos, mas há gestores que não as cumprem, preferindo o uso de infindáveis recursos, protelando a conclusão dos processos.

Causou particular incômodo ao governo federal, a ação do TCU sobre obras do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Em R$ 25 bilhões de recursos orçamentários, 99 obras foram fiscalizadas, recomendando-se a paralização de 13 por indícios de irregularidades graves e 17 tiveram retenção cautelar de pagamento.

Os auditores federais de controle externo são profissionais comprometidos com a cidadania. O TCU é uma Instituição de Estado, não um órgão de governo. Os relatórios dos auditores passam por um Ministério Público especializado. O atual presidente, ministro Ubiratan Aguiar, em recente entrevista à Folha de São Paulo, perguntado quanto à presença de ex-parlamentares entre os ministros julgadores, disse que seria útil que a imprensa mobilizasse a sociedade, para que a OAB e outras entidades passem a indicar nomes de ministros do TCU. A Constituição diz que o Congresso sugere nomes, não necessariamente de deputados e senadores.

A jornalista do Valor Econômico, Rosângela Bittar, no artigo “Governo quer liberdade total” diz que seria risonho o mundo do governo, sem o TCU. E que as campanhas movidas pelo Executivo são para evitar avaliações incômodas sobre a ação de gestores que querem sempre a unanimidade a seu favor. E as do Legislativo, por ver na ação do TCU “golpe da transferência de poder que imaginam ter ocorrido quando o TCU passou a dar a última palavra sobre as obras que poderiam ou não ser contempladas no orçamento”. O objetivo, segundo a jornalista, seria tentar enquadrar o TCU, ante as eleições de 2010.

Octavio Pessôa - advogado, jornalista e auditor federal de controle externo
Acompanhe-me pelo Twitter: http://twitter.com/octaviopessoaf


(Publicado no Diário do Pará, de 21/10/2009)